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Socioeducanda realiza pesquisa e contribui com diagnóstico sobre trabalho infantil

sexta-feira, 13 de abril de 2018 - 12:37 - Fotos: 

Privada de liberdade e bolsista PIBIC Ensino Médio (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Cientifica), da Universidade Federal da Paraíba e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), uma jovem pesquisadora deu uma aula no Centro Socioeducativo Rita Gadelha ao apresentar o resultado da pesquisa aplicada por ela sobre “A inserção precoce de crianças e adolescentes no trabalho e o envolvimento em atos infracionais”.

Ela é parte de um grupo de cinco adolescentes que cumprem medidas socioeducativas nas unidades de internação de João Pessoa e que são bolsistas/pesquisadores desde agosto do ano passado.

A pesquisa foi aplicada com 13 meninas em cumprimento de medida na unidade feminina, com idade entre 14 e 18 anos. Do total das entrevistadas, 62% afirmaram ter trabalhado antes do cumprimento da medida e 38% justificaram que trabalhavam para ajudar a família.

Desse total, 38% (maioria) estão na faixa dos 16 anos e 15% delas tem apenas 14 anos. Entre as que começaram a labuta precocemente, 55% tinham idade de 13 anos. No item ajudar a família, 40% delas começaram a arrumar casa, lavar prato, lavar roupa, quando tinham entre 12 e 13 anos.

O nível de escolaridade da maioria delas (46%) chegou ao 6º ano e todas interromperam os estudos antes mesmo de cumprirem medidas socioeducativas. As dificuldades de uma vida sofrida contribuíram muito para a evasão escolar. Entre as atividades de trabalho mais comuns estava o tráfico que envolveu 37% das adolescentes em cumprimento de medida. Trabalhar desde criança como babá, doméstica, balconista, feirante e faxineira, sem direito de estudar, eram as outras ofertas da sociedade.

Além das atividades identificadas nos questionários, as entrevistas revelaram a inserção em outras funções como coleta de lixo, cemitério, cuidado ou vigilância de crianças, pessoas idosas ou doentes e comércio ambulante, classificadas pelo decreto 6.481 como ‘Piores Formas de Trabalho Infantil’.

A jovem está hoje com 18 anos e contou que para tornar-se pesquisadora, mesmo afirmando não gostar de ler, se submeteu ao desafio de fazer uma redação em que dizia do seu interesse de participar da pesquisa. Concorreu com mais três pessoas e foi a selecionada.

A partir de então, como precisava ler, foi se sentindo estimulada pelos professores e passou a vislumbrar as oportunidades. “Na hora em que eu estava entrevistando as meninas, levava a sério, não me sentia uma socioeducanda. Me sentia chique e uma profissional”, relatou.

Ao concluir sua exposição sobre o trabalho desenvolvido nesta unidade socioeducativa, a jovem pesquisadora foi sabatinada por companheiras internas que desejavam um futuro promissor. Para ela, seus próximos passos incluem fazer o curso de Psicologia e trabalhar com a sócioeducação.

No decorrer do trabalho como pesquisadora também despertou o desejo de fazer o curso de Direito “para defender as adolescentes que cumprem medidas”. “Quero dar orgulho à família, estruturar minha independência e ser livre”, são os planos da socioeducanda, que não segurou as lágrimas de tanta emoção ao receber palavras de carinho, incentivo e de desejos de muito sucesso.

Projeto – A coordenação geral do projeto é da professora doutora Maria de Fátima Pereira Alberto, do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Estudos sobre o Desenvolvimento da Infância e Adolescência.

Segundo a professora, a ideia da pesquisa é buscar resposta onde se relacione dois aspectos: mostrar as consequências do trabalho infantil e o envolvimento com atos infracionais.

A equipe envolvida na pesquisa, que será concluída em julho deste ano, tem Hana de Castro Dourado Almeida (mestranda em Psicologia Social), Cibele Soares da Silva Costa (doutoranda em Psicologia Social), Aíla Souza Muniz (bolsista PIBIC), Ana Lucia dos Santos(bolsista PIBIC),Thiago Augusto Pereira (PIVIC), Marina Angelo de Mello (PIVIC) e Flávia Helena Pereira Cruz (voluntária).

Essa iniciativa pioneira que transformou alguns adolescentes privados de liberdade em bolsistas pesquisadores foi possível através de parceria com a professora Maria de Fátima Pereira Alberto, que agradeceu à socioeducanda por ter partilhado como ensinar e lidar com esse público.

A diretora técnica interina Waleska Ramalho, representando o presidente da Fundação Desenvolvimento da Criança e do Adolescente Alice Almeida (Fundac), Noaldo Meireles, disse que a entidade tem muito que agradecer à UFPB e que essa parceria se solidifica cada vez mais.

Ao se dirigir à socioeducanda, Waleska disse que ela deixa rica contribuição: “Hoje despertou algo novo para cada uma de vocês”, afirmou, argumentando que novas possibilidades podem se abrir. A parte executiva da pesquisa é da mestra e coordenadora do Eixo Educação da Fundac, Roberta Alencar.